
“Ensejo” é o nome do primeiro disco do Válvulas Imaginárias, projeto solo do músico Fernando Lodi.
A primeira vez que ouvi esse disco era noite, noite como o breu tomando conta de tudo, como se não houvesse mais obstáculos, afinal, não se enxergava nada. Então também fechei os olhos para o que me aguardava, e decidi apenas sentir.
Quando não se sabe o que está por vir, as possiblidades e as surpresas podem ser extremamente arrasadoras, e esse disco me arrasou.
Confesso que lágrimas escorreram.
Ao se colocar num lugar vulnerável, pronto para sentir, é onde mais se sente.
Como o caminho percorrido pela noite adentrando em diferentes coordenadas do planeta terra, a sonoridade do disco move-se pelos ouvidos e vai direto em nossas emoções.
Músicas instrumentais nos deixam libertos para fazer delas tudo o que desejamos, e cada canção, faixa a faixa, eu pude refletir da forma que eu queria, pois tudo parece tão simples, mas é tão além disso tudo que vivemos nesses últimos tempos.
“Ensejo” soa como a liberdade que a imensidão do universo nos dá. A chance de explorarmos cada canto, cada mísero pedacinho, cada átomo encontrado foi o que sempre deu esperança à humanidade.
Claro que em proporções diferentes, o trabalho de construção do disco “Ensejo” do Válvulas Imaginárias também explora aspectos sonoros de diversos lugares.
Você segue por caminhos já percorridos pelo post-rock, e ainda mais pelo math rock, porém não é a mesma coisa. É como se flutuasse pelo timbre post-rock meio psicodélico de Sigmun (banda de Bandung, Indonésia) e, no ar, se entrelaçasse com a classe e suavidade das melodias de Boraj (banda de Santiago, Chile).

Tudo começa sereno, calmo, límpido. Como quando a cigarra para de cantar no telhado no meio da madrugada e você sente aquele silêncio acalentador e aquilo se transforma na coisa mais prazerosa de toda a sua vida. Você é tomado ao completo.
E completos são os acordes de “Ensejo”, as harmonias tão bem compostas, o ritmo perfeito para o transe espiritual que nos coloca onde queremos estar, seja na manhã fria com o céu totalmente azul com a xícara de café ou naquele dia de trânsito infernal que a gente se pega parado, sem saída, apenas pensando em tudo o que deu errado em nossa vida para estarmos ali, naquele momento.
Extremamente recompensado pela sonoridade que me levou. Bendito o dia que coloquei os fones e dei o play. Confesso que foi extremamente difícil escrever tudo isso aqui sobre este disco, me faltaram muitas palavras.
O Disco
“Ensejo” foi elaborado aos poucos, dia a dia, mês a mês. Totalmente independente, o disco foi completamente feito pelo próprio Fernando Lodi: composição das melodias e letras, gravação de todos os instrumentos, mixagem, masterização e capa.
“Ano passado eu comecei a estudar como gravar, fui fazendo testes com algumas ideias que eu tinha na gaveta, que inclusive viraram músicas do disco e que mudaram bastante ao longo da gravação. Mas só esse ano as coisas começaram a pegar forma, e como eu fui aprendendo a gravar ao longo do processo, acabei demorando um pouco”, conta Fernando Lodi.

Cada uma das nove canções foi intitulada com um horário, esse horário é do exato momento em que o Válvulas Imaginárias fechou o arquivo de cada uma delas pela primeira vez, e quase todas foram finalizas em meio à madrugada.
Tudo feito dentro do quarto, bom, em partes sim. Percebemos em várias faixas barulhos gravados dentro de casa: o caminhar, o som do micro-ondas, o abrir da geladeira, o sentar na cadeira.
Fernando Lodi também é guitarrista e vocalista na banda Infante, porém foi a primeira vez que ele tomou a frente de um projeto como produtor de um disco, e garanto que ficou um trabalho incrível.
Jovens tristes dentro do quarto não são apenas jovens tristes. São reflexos de todo o mundo em que vivemos hoje. E em todo o mundo, e até além, “Ensejo” se coloca no espaço-tempo em que nós paramos para apenas ouvir uma música, mas acabamos inteiramente arrebatados psicologicamente pela delicadeza e complexidade de tudo que ele se tornou.
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