
“Amazonon” é o nome do primeiro disco solo do músico e compositor Juliano Abramovay, fundador da banda Grand Bazaar.
O dia estava nublado, e o calor já não era tão forte. Mas quando dei play e começou o disco tudo pareceu tão límpido e meu coração foi se sentindo aquecido aos poucos. Flutuei levemente com a sonoridade que ia tomando conta de tudo ao meu redor, a canção “Anzol” é maravilhosa. Fiz questão de colocar os fones de ouvido para experienciar “Amazonon”, e aconselho que você faça exatamente o mesmo.
Me senti tão próximo de cada uma das canções, acolhido, abraçado por cada nota, das mais suaves e amorosas até as mais ligeiras e vertiginosas. Engraçado sentir toda essa proximidade, pois não é um tipo de música que eu costumo ouvir, não por não gostar, mas por não fazer parte da minha vivencia musical. Mas Juliano Abramovay conseguiu mudar isso.
Músico extremamente estudioso, Juliano trouxe para este disco, com muito traquejo, experimentações sonoras que buscam estabelecer uma linha de melodias entre a música brasileira e tradições do Leste do Mediterrâneo, em particular a Grécia e a Turquia.
O resultado é “Amazonon”. Disco leve e forte ao mesmo tempo. É difícil explicar, é difícil de você entender o que estou dizendo, por isso é obrigatório ouvir o trabalho para compreender cada nuance presente nas harmonias e linhas instrumentais.
São seis anos explorando as sonoridades para criar conexões únicas e novos repertórios. A faixa que dá nome ao disco, “Amazonon”, composição de Juliano, é uma mostra de como tradições tão distintas e distantes podem convergir harmoniosamente.
“Para nós brasileiros, a primeira imagem que nos vem à cabeça quando nos deparamos com a palavra “Amazonas”, é a Selva Amazônica. Na Grécia, por outro lado, a primeira ligação é com o mito grego das Amazonas, uma tribo de mulheres guerreiras. E a conexão entre estes dois nomes se deve ao fato de um invasor espanhol ter sido atacado por uma tribo de mulheres guerreiras no Brasil, ter se lembrado da mitologia grega, e este nome ter ficado. São conexões curiosas, quase acasos que acontecem e que se solidificam nas identidades. Isto me interessa como músico: ir atrás dessas pontes imaginárias”, conta Juliano, que hoje vive na Holanda, onde leciona na Codarts – Conservatório de Rotterdã.
O Disco

No álbum, Juliano Abramovay toca violão, alaúde e violão sem traste – este último, criado pelo músico turco Erkan Ogur na década de 70. Ricardo Zoyo (contrabaixo) e João Fideles (bateria) ajudaram a dar liga e fazer novos arranjos das canções “Karcigar Pesrev”, “Ussak Saz Semai” e “Aparani Par”, composições tradicionais da Turquia e Armênia.
“Estas músicas usam um sistema de afinação diferente do ocidental e ritmos irregulares que são pouco comuns aqui no Brasil, como o 9/8, 10/8. Um dos desafios do disco foi apresentar o ritmo ao Ricardo e João que fizeram um trabalho incrível de criar a partir destes sistemas complexos”, relembra Juliano.
Além dos músicos brasileiros, juntou-se ao grupo a musicista grega Chrysanthi Gkika com a sua lyra ou kemenche, uma espécie de violino que se toca com a unha do dedo, adicionando uma coloração singular ao álbum.

O álbum foi gravado no Estúdio Canoa, em São Paulo, por Guilherme Jesus Toledo, tem mixagem e masterização por Celio Barros e é um lançamento pelo Selo Pequeno Imprevisto.
“Amazonon” é como explorar novos universos sonoros que se entrelaçam em movimentos regulares e irregulares pelo ar, transmitindo o afeto que as músicas brasileiras e mediterrâneas são capazes nos proporcionar.
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Leia o faixa à faixa
Anzol
A faixa que abre o disco foi composta por Juliano há muitos anos, muito antes de ter contato com a música do mediterrâneo. Em 2018, quando estava na Grécia ensaiando com Chrysanthi, mostrou a ela a canção. A musicista grega se conectou imediatamente com “Anzol” – mesmo não fazendo parte de sua linguagem. Então, Juliano fez o arranjo para violão e lyra que depois foi expandido para a banda toda.
Aparani Par
É uma peça tradicional armênia, que utiliza a combinação de ritmos regulares com ritmos irregulares. “Aparani Par” é bastante presente em danças circulares (ou danças de roda).
Ussak Saz Semai
Composto pelo armênio Tatyos Efendi no começo no final do século XIX, “Ussak” é o nome de um dos muitos modos que compõe a música clássica otomana. Já “Saz Semai” é uma forma também muito importante para esta cultura e utilizada em cerimônias Sufis. Neste arranjo, os músicos trouxeram elementos rítmicos brasileiros.
Modinha
Além do nome desta música, “Modinha” também é o nome de um gênero presente nos primórdios da criação da música popular brasileira. Gabriel Levy, autor da peça, explorou o lirismo do gênero em combinação com um ritmo muito comum nos Balcãs e no mediterrâneo, o 7/8. Com a lyra de Chrysanthi buscou-se reforçar o caráter lírico e o diálogo com o Brasil.
Karcigar Pesrev
“Pesrev” é muitas vezes traduzido como Prelúdio; são peças que introduzem o modo que será apresentado durante as cerimônias. O modo em questão, “Karcigar”, também é visto com frequência na música da região. O turco Salih Dede, que viveu entre os séculos XVIII e XIX, é o compositor desta peça.
Amazonon
A faixa que dá nome ao disco apresenta referências da música grega na parte do ritmo e na melodia, ao mesmo tempo em que mantém a identidade de Juliano como músico brasileiro. Juliano compôs a peça em Tessalônica (Grécia), em 2018.
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